
A Sagrada Família do Pássaro – Bartolomé Esteban Murillo (1617–1682)
Por que a primeira infância pertence à família — e não ao Estado
Introdução
Dados recentes do Censo Escolar 2024 revelam que o número de crianças de 0 a 3 anos matriculadas em creches no Brasil cresceu apenas 1,5% em relação ao ano anterior, totalizando 4,18 milhões de alunos. Isso representa cerca de 38,7% da população nessa faixa etária, ficando aquém da meta de 50% estabelecida pelo Plano Nacional de Educação para 2024 . Para muitos, esse número é alarmante. Para outros, entre os quais me incluo, trata-se de uma oportunidade para refletirmos sobre as verdadeiras causas dessa realidade — e, mais profundamente, sobre o papel da família na formação da criança.
A falácia da instrução como solução total
Victor Hugo dizia: “Abrir uma escola é fechar uma cadeia”. Paul Bert ecoava: “A criminalidade diminui com a instrução”. Ambos estavam errados — ou, ao menos, incompletos. A instrução, por si só, não forma homens completos. Pode até formar técnicos, mas não necessariamente cidadãos virtuosos.
O pensador francês François Guizot advertiu com precisão:
“O desenvolvimento intelectual só por si, separado do desenvolvimento moral e religioso, torna-se um princípio de orgulho, de insubordinação, de egoísmo e, consequentemente, um perigo para a sociedade.”
É isso que vemos hoje: gerações escolarizadas, mas vazias de sentido, frágeis moralmente, e muitas vezes hostis à própria ideia de autoridade, fé e pátria.
A lógica tecnocrática e o sequestro da infância
Na ânsia de “resolver” o problema da infância, governos e especialistas apresentam soluções quantitativas: mais vagas, mais dados, mais metas. A infância se tornou um problema de gestão. A creche, um símbolo de progresso. Mas esse paradigma parte de um pressuposto destrutivo: a família falhou — e o Estado deve ocupar seu lugar.
Ora, a primeira infância não é do Estado. Ela pertence ao lar. É no convívio íntimo com os pais — especialmente com a mãe — que se formam as primeiras referências afetivas, morais e cognitivas. Delegar essa fase a instituições, ainda que bem-intencionadas, é roubar da criança sua identidade mais profunda.
A ideologia da emancipação feminina e a crise do lar
A pressão por mais creches decorre também de uma mudança cultural: a ideia de que a maternidade atrapalha a realização da mulher. Antigamente, ser mãe era um chamado elevado. Hoje, é vista muitas vezes como obstáculo para o “sucesso”. Muitas mulheres voltam ao trabalho semanas após o parto — não por escolha real, mas por exigência do sistema ou por doutrinação ideológica.
Não se trata de criticar a mulher que trabalha, mas sim de denunciar um modelo social que despreza o valor do cuidado materno como missão formativa fundamental.
Instrução sem coração é ruína
A verdadeira educação é mais do que transmitir informações. É formar o homem inteiro: corpo, alma, mente e espírito. Como escreveu Mgr. Dupanloup:
“Como é falha de coração e de vida a educação em que a mãe não toma parte! E quanta hesitação e fraqueza na educação de que o pai anda arredio!”
Sem a presença viva dos pais, a educação se torna técnica, fria, desumanizada. E, pior, facilmente manipulável por ideologias.
O verdadeiro alicerce é a família
Cristovam Buarque, ex-ministro da Educação, ex-reitor da Universidade de Brasília e político historicamente vinculado à esquerda progressista, afirmou recentemente que “primeiro o alicerce”, referindo-se à educação infantil como base da cidadania. Está certo quanto à importância da base. Mas erra ao identificar a creche como esse alicerce. O verdadeiro fundamento da sociedade está no seio da família, onde se aprende o amor, o limite, a fé e a responsabilidade.
Creches podem ser apoios subsidiários. Nunca substituições.
Por uma política de fortalecimento da família
Ao invés de simplesmente aumentar o número de instituições para cuidar dos filhos alheios, por que não investir na própria família?
Algumas propostas possíveis:
- Auxílios direcionados a mães que desejam cuidar dos filhos pequenos;
- Incentivos fiscais para famílias com crianças em tempo integral no lar;
- Políticas de valorização da maternidade como vocação essencial à vida nacional.
Conclusão: a infância é sagrada
Uma sociedade que confia mais no Estado do que na família para formar seus filhos é uma sociedade em colapso.
Se queremos adultos seguros, éticos e enraizados em valores verdadeiros, devemos restaurar a autoridade e a centralidade do lar.
A infância não pertence ao governo, aos especialistas ou aos pedagogos. Pertence aos pais — e, acima de tudo, a Deus.